A Circular de Oferta de Franquia (COF) é um documento fundamental no sistema de franchising brasileiro, regulamentado pela Lei nº 13.966/2019 (nova Lei de Franquias). Sua principal finalidade é assegurar a transparência e fornecer ao potencial franqueado informações detalhadas sobre o negócio que se propõe a franquear, incluindo histórico, suporte oferecido, obrigações financeiras, pendências judiciais, entre outros elementos cruciais. Entretanto, a elaboração descuidada desse instrumento pode gerar anulações contratuais, litígios e até mesmo responsabilidade civil para o franqueador. A seguir, abordam-se os erros mais frequentes na criação da COF e como preveni-los.
1. Subestimar a Importância da COF
1.1. Entender a COF como uma Simples Formalidade
Muitos franqueadores consideram a COF como mera burocracia, sem compreender que ela constitui uma ferramenta de segurança tanto para o franqueador quanto para o franqueado. Quando a circular é elaborada de forma incompleta ou inexata, aumenta-se o risco de nulidade do contrato de franquia e responsabilidade indenizatória.
1.2. Impacto Legal
A COF deve ser entregue ao potencial franqueado com no mínimo 10 dias de antecedência à assinatura do contrato ou pagamento de qualquer taxa, conforme disposição legal. O descumprimento desse prazo ou a omissão de informações relevantes pode acarretar sanções previstas na Lei de Franquias, incluindo o direito de ressarcimento ao franqueado.
2. Falhas na Descrição do Modelo de Negócio
2.1. Ausência de Descrição Detalhada
Um dos grandes atrativos do sistema de franquias é o know-how. Ao elaborar a COF, o franqueador deve oferecer uma visão clara de como o negócio funciona, evidenciando métodos, processos operacionais, treinamento e suporte. Descrever de forma vaga ou genérica tende a gerar expectativas irreais, abrindo espaço para disputas futuras.
2.2. Informações Desatualizadas
É preciso apresentar dados recentes a respeito de resultados, número de unidades em operação, suporte efetivamente fornecido e assim por diante. Omitir atualizações ou deixar de rever a COF periodicamente pode levar o franqueado a sentir-se induzido em erro, expondo o franqueador a reclamações de propaganda enganosa ou quebra de dever de transparência.
3. Omissão de Informações Financeiras
3.1. Falta de Clareza sobre Taxas e Investimento Inicial
A Lei de Franquias exige que sejam detalhadas as taxas de franquia, royalties, taxas de publicidade e demais valores cobrados do franqueado, além de estimativas realistas do investimento inicial. Não fornecer um cronograma de desembolsos ou prever custos ocultos pode resultar em litígios, uma vez que o franqueado se vê diante de despesas não previstas.
3.2. Demonstrações Contábeis Incompletas
No caso de franquias estabelecidas, também é crucial mencionar balanços ou demonstrativos financeiros que ilustrem a solidez do franqueador, conforme exigido pela legislação. Transparência financeira reforça a credibilidade da rede e diminui as chances de acusação de omissão dolosa de dados vitais.
4. Inconsistências sobre Território e Exclusividade
4.1. Falta de Definição do Território
Uma das cláusulas mais sensíveis em contratos de franquia versa sobre o território de atuação do franqueado. Quando a COF não esclarece se haverá exclusividade ou delimitação geográfica, surgem disputas envolvendo sobreposições de unidades franqueadas. Uma descrição detalhada evita conflitos internos na rede, protegendo ambos os lados.
4.2. Excesso de Subjetividade
Se a COF menciona exclusividade “sempre que possível” ou sem especificar condições objetivas, cria-se insegurança. O franqueador deve explicitar critérios para abertura de novas unidades no mesmo território e as possíveis exceções (ex.: lojas próprias, quiosques, estabelecimentos em rodoviárias ou aeroportos etc.).
5. Omissão de Pendências Judiciais e Históricos Relevantes
5.1. Litígios Envolvendo o Franqueador
A Lei de Franquias obriga a divulgar eventuais processos judiciais ou arbitrais em que o franqueador figure, bem como suas resultantes indenizações ou sanções. Omitir tais informações configura violação do dever de boa-fé, sendo passível de responsabilização caso o franqueado venha a alegar ter assumido o negócio sem conhecer tais riscos.
5.2. Histórico de Encerramento de Unidades
A COF deve mencionar quantas unidades fecharam nos últimos anos, bem como o motivo do encerramento (rescisão por inadimplência do franqueado, insucesso comercial, acordo amigável etc.). A falta dessa transparência pode enganar o potencial franqueado quanto à taxa de sucesso da rede.
6. Deficiências na Descrição do Suporte Oferecido
6.1. Treinamento, Manuais e Suporte Operacional
É fundamental indicar na COF que tipo de treinamento o franqueado receberá, duração, áreas cobertas (como marketing, gestão de estoque, finanças), além de suporte contínuo (visitas de consultores, central de atendimento etc.). Manter a descrição genérica (“oferecemos todo o suporte necessário”) sem detalhar escopo, periodicidade e contrapartidas pode gerar frustrações.
6.2. Falta de Padronização
Uma das premissas do franchising é a padronização. Caso a COF não aponte manuais de operação, identidade visual, layout de loja ou padrões de qualidade, o franqueado pode argumentar que o “modelo” não foi efetivamente transferido, reivindicando quebra de contrato.
7. Esquecimento de Cláusulas de Confidencialidade e Propriedade Intelectual
7.1. Proteção ao Know-How
Ao compartilhar informações estratégicas para que o franqueado conduza o negócio, o franqueador precisa resguardar segredos de negócio e direitos de propriedade intelectual (marcas, patentes, direitos autorais sobre manuais). Não prever cláusulas de confidencialidade e restrições de uso na COF deixa a rede vulnerável a cópias e aproveitamento indevido.
7.2. Sanções em Caso de Vazamento
A COF (e, posteriormente, o contrato de franquia) deve prever sanções para o caso de vazamento de informações confidenciais. A ausência desse dispositivo enfraquece a capacidade do franqueador de impor respeito às normas de sigilo.
8. Descuido com o Prazo Legal de Entrega da COF
8.1. Observância do Prazo Mínimo de 10 Dias
A lei determina que o franqueado tenha, no mínimo, 10 dias para analisar a COF antes de assinar qualquer contrato ou pagar taxas iniciais. Descumprir essa norma pode ensejar nulidade do contrato de franquia ou até mesmo obrigação de restituir valores investidos ao franqueado.
8.2. Ato Comprovável e Data Certa
Idealmente, a entrega da COF deve ser documentada (por exemplo, com protocolo assinado pelo potencial franqueado), demonstrando a data exata de recebimento. Isso protege o franqueador de alegações futuras de entrega tardia ou inexistente.
9. Ausência de Revisão Jurídica Especializada
9.1. Complexidade da Lei de Franquias
Embora a COF seja essencialmente um documento de divulgação e transparência, envolve inúmeros aspectos legais. Um advogado experiente em Direito Empresarial e Franchising faz a diferença na identificação de pontos omissos ou dúbios, ajustando a COF às particularidades de cada rede.
9.2. Riscos de Modelos Copiados
O uso de modelos genéricos encontrados na internet ou copiados de outras franquias pode levar a incoerências e não atender às especificidades do negócio. Cada rede tem suas características próprias, exigindo uma COF personalizada.
10. Conclusão
A Circular de Oferta de Franquia atua como pilar de confiança e transparência entre franqueador e franqueado. Evitar erros comuns — como omitir informações relevantes, desrespeitar prazos legais, apresentar dados financeiros incompletos ou deixar de especificar o suporte efetivo — é fundamental para manter a segurança jurídica e prevenir litígios que possam desgastar a rede.
Ao elaborar a COF, o franqueador deve ter cautela e assessoramento especializado, garantindo total clareza sobre a natureza do negócio, as obrigações financeiras, os direitos de exclusividade territorial, o histórico da rede e a estrutura de suporte oferecida. Seguindo esses cuidados, reduz-se exponencialmente o risco de questionamentos futuros, assegurando o equilíbrio e a boa-fé na relação de franquia.
Referências Legais e Bibliográficas
- Lei nº 13.966/2019 (Lei de Franquias): Dispõe sobre o sistema de franquia empresarial (franchising).
- Doutrina de Direito Empresarial e Franchising: Diversas obras analisam a elaboração da COF e detalham as obrigações de franqueador e franqueado.
- Pareceres Jurídicos Especializados: Consultorias focadas em formatação de franquias e due diligence para redes franqueadoras.
(Este artigo possui finalidade informativa. Em situações concretas, recomenda-se a consulta a profissionais especializados em Direito Empresarial e Franchising.)